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Povos e Populações Vulneráveis

no Contexto da Mudança do Clima

Impactos Vulnerabilidade Povos indígenas Medidas de adaptação Conteúdos recomendados por parceiros

Os efeitos da mudança do clima, dentre eles a intensificação de eventos climáticos, atinge a todos, mas a repercussão e intensidade de seus impactos não serão vivenciados da mesma forma pelos diferentes povos e populações. O relatório do IPCC de 2014 enfatiza que houve agravamento dos desafios enfrentados por populações que estão em situação precária no que tange aos direitos básicos. No contexto brasileiro, onde ainda perduram acentuadas desigualdades sociais e regionais, a pobreza é um dos fatores que mais contribuem para aumentar a sensibilidade da população aos efeitos da mudança do clima e reduzir sua capacidade adaptativa (Brasil, 2016). Outros fatores que contribuem para a condição de vulnerabilidade social são as questões de gênero, cor e raça, e grupos populacionais tradicionais e específicos (GPTEs), especialmente inseridos em um contexto de desigualdades estruturantes (COEP, 2011).

As particularidades de um povo ou população são a principal riqueza e o maior desafio no levantamento de riscos climáticos. Aqui é evidenciada uma lacuna na compilação de informações e análise de dados, assim como a intangibilidade de indicadores globais quanto à qualidade da vida das pessoas. Parte importante do fortalecimento de estruturas de adaptação, portanto, passa por identificar e sanar a lacunas de dados no Brasil sobre vulnerabilidade de grupos específicos e sua capacidade de adaptação.

O CadÚnico (Cadastro Único) pode ser uma primeira ferramenta para a identificação dos grupos populacionais principais, uma vez que esse instrumento identifica e caracteriza as famílias de baixa renda. Dentre os grupos identificados como populações mais vulneráveis socialmente no Brasil, os GPTEs apresentam um perfil ainda mais vulnerável, por possuir sensibilidades mais significativas (menor renda, menor escolaridade e menor acesso a serviços básicos) que as demais famílias. Já entre os grupos com maior percentual de extremamente pobres entre os GPTE, estão em grande parte aqueles de etnias minoritárias (indígenas com 77,4%, quilombolas com 74,2% e ciganos com 75,2%), grupos diretamente dependente de recursos naturais (extrativistas com 81,7%, pescadores com 75% e ribeirinhos com 84,5%), famílias em situação de rua (87,6%) e agricultores familiares (74,1%). Estes fatores tornam os GPTEs prioridade no desenvolvimento de estratégias de adaptação (Brasil, 2016).

Impactos da mudança do clima sobre povos e populações vulneráveis

Alterações do clima e seus impactos ocorrerão de forma desigual no território brasileiro. No que diz respeito a grupos de pessoas, as alterações climáticas, os impactos e as consequências desses impactos formam uma rede complexa de interações que podem ser potencializadas. Alguns exemplos de impactos são (Brasil, 2016):

  • Redução de volume de lagoas e redução dos níveis dos rios, comprometendo a subsistência e isolamento de ribeirinhos.
  • Calor excessivo, que afeta principalmente populações carentes com dificuldades de adaptação às novas condições devido à falta de recursos.
  • Aumento de vetores de doenças devido ao aumento de temperatura.
  • Comprometimento da agricultura, prejudicando a subsistência e a produção de alimentos.
  • A improdutividade agrícola pode levar a população a migrar para as grandes cidades da região ou para outras regiões em busca de trabalho, gerando ondas de “refugiados ambientais”.
  • Novos furacões poderão atingir a costa sul do Brasil (exemplo Furacão Catarina), e o regime dos ventos também poderá ter padrões distintos em outras regiões do Brasil (a exemplo do que já se observa no Parque Indígena do Xingu).
  • O aumento da ocorrência de enchentes, deslizamentos e alagamentos por conta de extremos de chuva pode provocar perdas econômicas e de vidas.
  • Construções à beira-mar poderão desaparecer, portos poderão ser destruídos e populações podem ter que ser remanejadas.
  • Os incêndios florestais poderão ser mais intensos em determinadas regiões, comprometendo a saúde, a subsistência e a moradia de pessoas que vivem nos ecossistemas afetados.
  • Pode haver alterações na fenologia das espécies de plantas e animais importantes do ponto de vista nutricional e cultural.

É importante destacar que os impactos da mudança do clima podem se somar ou intensificar outros impactos que os povos e populações vulneráveis já enfrentam nas diversas regiões do Brasil, tais como: o desmatamento ilegal em seus territórios; os impactos ambientais oriundos de obras e atividades poluidoras; a degradação ambiental no entorno dos territórios pela expansão das frentes agropecuárias; entre outros.

Vulnerabilidade Populacional à Mudança do Clima

As abordagens para identificação e análise da vulnerabilidade populacional à mudança do clima sugeridas pelo Plano Nacional de Adaptação, que podem ser aplicadas complementarmente entre si, são: (i) Territorial por Recorte Municipal e (ii) Territorial por Bioma. A primeira é baseada no desenvolvimento de um Índice para Análise da Vulnerabilidade Social à Mudança do Clima em escala municipal e utiliza subíndices de exposição, sensibilidade e capacidade de adaptação, numa parceria do Ministério do Meio Ambiente com a Fundação Oswaldo Cruz. A segunda utiliza-se dos biomas como critério de análise. Os GPTE, neste caso, estão concentrados principalmente no Bioma Amazônico (60,3%) e no Bioma Caatinga (19,9%).

Conforme estudo (UFSC, 2012) sobre desastres naturais ocorridos no Brasil entre 1991- 2010, as regiões com maior concentração de desastres por intensidade de ocorrência localizam-se no Norte, Nordeste, Sudeste (norte e faixa litorânea) e na região Sul. Quando este mapa é contraposto com o número de famílias com renda per capita até R$ 77,00 nota-se que estas localizam-se, em sua maioria, em regiões de grande exposição climática, principalmente na região Norte e Nordeste.

Outro termo que se aplica a essas situações é o fenômeno da dupla exposição que está na base da vulnerabilidade socioambiental e se expressa na coexistência ou sobreposição espacial entre grupos populacionais muito pobres e com alta privação (vulnerabilidade social) e áreas de risco ou degradação ambiental (vulnerabilidade ambiental) (COEP, 2011).

Povos indígenas e mudança do clima

Ao se avaliar os efeitos da mudança do clima sobre populações humanas, há que se destacar a enorme diversidade étnica e cultural representada pelos mais de 300 povos indígenas e seus sistemas próprios de organização, inseridos em uma variedade de contextos territoriais e socioambientais. Seu estilo de vida dependente diretamente dos recursos naturais e da diversidade biológica das áreas em que vivem, o que faz com que os impactos da mudança do clima sobre suas culturas e territórios sejam precoces e severos; por isso, esses povos são classificados como grupo de alta vulnerabilidade à mudança do clima.

Ao mesmo tempo, os povos indígenas possuem conhecimentos tradicionais sobre os ciclos sazonais anuais e interanuais e suas inter-relações com os demais componentes dos ecossistemas em que vivem. Os conhecimentos tradicionais, práticas culturais, padrões de ocupação territorial e sistemas próprios de manejo dos recursos ambientais adotados pelos povos indígenas têm historicamente promovido a conservação da biodiversidade e dos ciclos hidrológicos, a contenção do desmatamento, a manutenção do estoque de carbono florestal e a provisão de uma série de serviços ambientais importantes para a manutenção da estabilidade das condições climáticas. Estes conhecimentos podem prover valiosas informações em nível local e regional, servir de fonte à verificação regional de modelos e dados científicos globais e oferecer a base para a elaboração de estratégias de adaptação e mitigação (Brasil, 2016).

Atualmente, os povos indígenas do Brasil já participam ativamente das instâncias de discussão sobre mudança do clima nos âmbitos nacional e internacional. Inclusive, a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil – organização que representa os interesses dos povos indígenas em escala nacional – criou o Comitê Indígena de Mudanças Climáticas - CIMC. Os membros indígenas deste Comitê têm participado ativamente de capacitações em mudança do clima e das instâncias de diálogo e tomada de decisão criadas nos âmbitos das políticas nacionais que os afetam nesta temática, tais como: a Câmara Temática de Mudança do Clima do Comitê Gestor da Política Nacional de Gestão Territorial e Ambiental de Terras Indígenas; e as Câmaras Consultivas Temáticas da Estratégia Nacional para REDD+ do Brasil.

Medidas de adaptação para povos e populações vulneráveis

As medidas de adaptação para povos e populações vulneráveis devem ser estruturais, buscando atenuar ou corrigir situações socialmente injustas de pobreza (COEP, 2011):

Alguns exemplos são:

  • Fomentar a inclusão social dos povos mais vulneráveis dando ênfase à capacitação para gerar autonomia em populações altamente dependentes de subsídios governamentais.
  • Promover a construção de capacidades para populações vulneráveis, que lhes permitam se prevenir e reagir aos eventos extremos, tanto em termos da adequação da infraestrutura, quanto em termos de engajamento de organizações e lideranças locais.
  • Fomentar iniciativas de ordenamento territorial, garantindo o acesso ao território e o desenvolvimento de ações de inclusão produtiva aliadas ao manejo sustentável dos recursos do território.
  • Fomentar utilização de medidas de Adaptação Baseada em Ecossistemas (AbE) que visa incrementar a capacidade adaptativa de populações a partir do uso dos recursos naturais e da biodiversidade.
  • Garantir processos de formação, informação, participação e consulta sobre a temática da mudança do clima em políticas e projetos, que alcancem as bases comunitárias e distintos componentes societários (geração e gênero, por exemplo).
  • Promover estudos e planos locais sobre adaptação à mudança do clima, que realizem o diálogo entre conhecimentos científicos e tradicionais, baseados em percepções das comunidades, e protagonizados pelos povos e populações envolvidos.
  • Fortalecer a implementação das políticas nacionais voltadas aos povos e populações vulneráveis, sejam estas de gestão territorial e/ou ambiental; inclusão produtiva; organização de empreendimentos comunitários; fortalecimento da agricultura familiar; criação de banco e feiras de sementes; acesso à agua; entre outras que promovem a diminuição da vulnerabilidade à mudança do clima.

Conteúdos recomendados por parceiros 

Os parceiros da AdaptaClima que atuam no tema de povos e populações vulneráveis recomendam os seguintes conteúdos para compreender a relação entre o tema e adaptação à mudança do clima: 

(Última atualização: julho de 2018)

Para mais conteúdos neste tema, faça uma busca avançada na Biblioteca de Conteúdos.

 

Referências do texto:

  1. Atlas brasileiro de desastres naturais 1991 a 2010: volume Brasil. Centro Universitário de Estudos e Pesquisas sobre Desastres. UFSC, 2012.
  2. Fifth Assessment Report - Working Group 2. IPCC, 2014.
  3. Integração da Adaptação às Alterações Climáticas na Cooperação para o Desenvolvimento Guia para o Desenvolvimento de Políticas. OCDE, 2011. 
  4. Mudanças climáticas, vulnerabilidades e adaptação. COEP, 2011.
  5. Plano Nacional de Adaptação à Mudança do Clima: volume 2: estratégias setoriais e temáticas. Ministério do Meio Ambiente. Brasil, 2016.